quinta-feira, 6 de agosto de 2015

IV. A retomada

                                                      Rafael não sabia o que fazer e nem o que dizer diante da determinação de Ana Maria em subir aquela ponte. Por fim disse:


- Vou com você até a ponte, Ana Maria. Mas não vou subir.

Ana Maria chegou ao pé daquele acesso ao céu, leu novamente a placa, que proibia as crianças e os adolescentes de só subirem acompanhados de seus pais. Ponderou se devia fazer aquilo mesmo, infringindo a lei. Ficou olhando em silêncio para o alto, para as nuvens que cobriam a parte mais alta da ponte à qual não podia ser avistada. Olhou para Rafael, abraçou-o, deu-lhe um beijo no rosto, olhou-o novamente com os olhos umedecidos e disse com emoção:

- Tchau, Rafael. Reze por mim, – e subiu em disparada a ponte.

Rafael ficou olhando-a se afastando, mas não pode resistir o que o seu íntimo estava lhe pedindo: siga-a. E ele correu atrás dela, chegou ao seu lado e sorriu:

- Posso ter a honra de acompanha-la?

Ana Maria deu um grito de emoção e o beijou-o novamente, mas desta vez foi um beijo mais terno. Os dois seguiram em frente lado a lado, primeiro com passos simples. Logo se puseram a correr. Correram, correram, correram… Subiram, subiram, subiram… Rafael se adiantou. Ana Maria chamou-o, pedindo para que a esperasse. Rafael então parou e olhou para trás – não, não, ele não deveria ter feito isso. Olhou na direção dela, que vinha subindo já com passos cansados. Então seus olhos se encheram de uma paisagem que jamais alguém antes havia contemplado. Eram florestas, rios, pomares flores e animais de todas as espécies. Também viu muita gente, grupos de gentes. Em todos eles havia muita música, muita dança, muita festa. E tudo formava um conjunto harmonioso de paz e alegria que só poderia ser visto da altura em que ele estava.

Quando Ana Maria viu Rafael olhando para trás, gritou-lhe desesperada, gesticulando para que se desvirasse. Porém, os olhos dele já brilhavam extasiados. Então a ponte se pôs a tremer com violência. Ana Maria deitou-se e, fincando suas unhas nos vãos do assoalho, tentava com todas as suas forças não ser arremessada da ponte. Rafael correu ao corrimão, segurou-se nele como pode e se esforçou para chegar onde ela estava a fim de ajudá-la a subir. Mas ele não conseguia sair da sua posição de segurança, se fizesse qualquer tentativa de deslocamento, seria lançado para longe. Viu aterrorizado como pedaços dos trechos da ponte, mais acima, iam se desprendendo, subindo e desintegrando-se. O tremor do piso onde estava se intensificou e ele foi arremessado para o alto. Caiu ainda na ponte e foi escorregando. Levou Ana Maria junto com sigo de arrastão. Até que os dois chegaram ao início da ponte, que parou de tremer.


Depois de alguns minutos, os dois se refizeram do choque, se levantaram ainda assustados e olharam para a ponte. Se a profecia era de fato real, parecia que ela agora não poderia ser jamais cumprida, já que a ponte não mais existia. Ninguém mais poderia subir por ela. O único que restou de toda a sua estrutura foi uma simples rampa que acabava no vazio, após uns cem metros. A placa, no entanto, continuou intacta.

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